terça-feira, 13 de abril de 2010

Era uma vez

Era uma vez um país. Este país viveu mais de 300 anos sob administração de ditadores. Em cerca de 300 anos nenhum cidadão podia eleger seu representante máximo, em nenhuma instância. Nesse tempo todo, foram os anos que este país mais fortaleceu sua infra-estrutura e mais (rodovias, ferrovias, indústrias, por exemplo). Não a toa, ainda conhecemos pessoas desse país que evocam com paixão e saudosismo os anos ditatoriais.

As pessoas desse país, por não conviverem a tanto tempo com o sufrágio universal, se acostumaram logo a ficar à mercê dos líderes, mesmo em tempos de democracia. As cobranças dos cidadãos, quando existiam, eram logo repelidas pela polícia (que, obviamente, foi criada para proteger o governo e não a população - só depois alguns membros desse órgão tiveram a noção que a polícia estava a serviço da justiça, seja de que lado fosse).

Por nunca terem convivido muito tempo com a opção da escolha, as pessoas desse país também se acostumaram com as mazelas do país e com a ineficiência do governo (que nunca se acostumou à servir à população, preferindo sempre a servir a si mesmo, em todos os sentidos - econômico preferencialmente). Era comum dizerem que sempre foi assim, nunca mudou e nunca vai mudar.

Não dá pra entender se isso era um pessimismo generalizado, era questão de cultura, simplesmente apatia ou medo da tal polícia.

E, por isso mesmo, aceitavam de bom grado que serviços essenciais à vida, como saneamento básico e eletricidade, fossem monopolizados. Numa primeira fase, esse monopólio era do governo. A partir de um tempo, o governo repassou esse monopólio a outras empresas, para que estas controlassem tanto as tarifas quanto a qualidade do serviço. Essas empresas chegaram à conclusão que terceirizar o serviço dava mais lucro e menos dor de cabeça. Porque o problema não era deles mais, e sim da terceirizada. E terceirizadas, nesse país, faziam o trabalho pelo menor preço com a pior qualidade possível, dado o material de péssima qualidade e mão-de-obra tão ruim quanto. Tudo pra gastar menos e ter mais lucro.

Essas empresas, com livre arbítrio, começaram a se estruturar melhor, ganhando um lucro considerável em cima de serviços essenciais. Com mais lucro por menos qualidade, uma dessas empresas chegou até mesmo a aplicar a grana numa bolsa de valores no país mais poderoso deste mundo. E o lucro quadruplicava em semanas. A qualidade piorava a cada dia. Tinham a certeza de que, se alguém reclamasse, podia ficar sem tal serviço, numa certa brincadeira de represália.

Já que eram os únicos a dar tal serviço, ninguém se atrevia a contestar sua autoridade no assunto. Afinal, era a única mesmo, as pessoas de tal país tinham de se contentar com isso...E o país ficou nisso por um bom tempo. Não há registro de que algo tenha melhorado nesse quesito.

[Esse post vai em "homenagem" aos inúmeros palavrões proferidos hoje a uma certa empresa de saneamento básico. Provavelmente escreva mais sobre esse país daqui a um tempo. Até porque não falei nada da área que atuo diretamente: a habitação.]

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