segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Falta de coragem

Como eu esperava, quase fui demitida hoje.

O motivo?

Não fui a inúmeros eventos políticos realizados pela prefeitura de Embu.

A gota d'água foi nessa sexta e sábado, na qual fui convocada, junto aos demais funcionários, para ir a dois eventos, um do PT e outro da prefeitura mesmo. Nunca concordei em ir, principalmente porque não aprovo o atual governo municipal que pouco faz pela habitação social, minha área de trabalho lá.

Mas não ter ido foi a deixa para que os demais funcionários reclamassem ao presidente da empresa pública que faço parte. E isso, aliado ao fato de eu ter falado que não ia ao evento de hoje, fez o presidente cortar minha cabeça.

Ou quase.

Minha chefe intercedeu por mim.

Me pediu pra ir ao evento caso quisesse continuar trabalhando lá. Que pediu ao presidente que teria a última conversa comigo. Que eu teria de decidir por mim mesma, já que ela tinha feito mais que a parte dela. Que ela argumentou de tudo, até mesmo dizendo que "tinha gente que não trabalhava nada e só ia a eventos, enquanto a gente ralava até às 19h". No qual respondi pra ela: "Mas, pro presidente, é tudo igual, certo? Quem trabalha ou deixa de trabalhar, não importa. É mais importante quem vai a evento". Ela respondeu que sim, resignada, dizendo que até ela deveria ir mais a eventos, depois dessa.

E eu fui. Covardemente, estava eu lá no evento. No qual nem ouvi nada, absorta que estava em meus pensamentos.

Porque, apesar de ter a vida inteira pela frente, eu não abandonaria minha chefe. Eu não abandonaria o trabalho que me faz tão bem, apesar de tudo. Eu não abandonaria a verdadeira causa de eu estar lá: a população de Embu, as obras e o que poderia reverter por lá.

Covardemente, aceitei a ordem que estava muito disposta a desobedecer e sair de vez de Embu.

Pela minha chefe. Pelo trampo inacabado.

Quando sair de lá, terei de deixar tudo em ordem. Coisa que não teria vez agora. Quando sair de lá, já vai ser engatilhado num outro trampo. Porque idealismo não paga contas da casa.

Mas hoje foi a pior derrota que já sofri.

Ao fim do dia, indo embora, a chefe me disse um "Obrigada por ter ido. E me desculpa por ter te colocado nessa posição". No qual respondi: "Me senti muito mal hoje. Mas, desculpa, por que? Esse é o jogo, não? Se não fosse por você, eu não estaria aqui". Ela concordou, nos despedimos e fui embora.

Nunca chorei tanto. De raiva. De ódio. De mim mesma. Dos outros funcionários que ficaram batendo na tecla que eu nunca fui a nada. Mas, mais ódio de mim mesma. De não seguir meus pensamentos primários de ir embora. De ter aceitado a ordem.

Mas, depois, pensando melhor, fiquei feliz da chefe me defender. De me pedir algo tão caro a mim. Acho que ela entendeu que, por mais mínimo que seja participar de um evento, me era extremamente caro. E, mais que isso, eu sair da Companhia por isso era extremamente caro a ela. Acho que só ela sabe minha real importância lá dentro.

A pior coisa (ou melhor, sei lá), é que o trampo é realmente muito bom. Não trocaria por nada. Mesmo com todas essas babaquices. Mesmo com todos e demais contratempos.

Eu joguei, e perdi. Vamos ver até quando eu realmente aguento.

ps.: tenho cargo comissionado, de confiança, que quer que chamem. Mas, em hipótese nenhuma, estou ligada a algum político da cidade. Não fui indicada pelo presidente, pelo prefeito ou por algum deputado importante. Passei numa entrevista em que tive a sorte do presidente não ter nenhum conhecido arquiteto (ao contrário de quem ele escolheu pra assistente social). Tive a sorte de ter sido realmente escolhida pelo trabalho intelectual dentre outros arquitetos. E, pra mim, cargo de confiança significa confiança no trampo, sem ligações partidárias nenhuma que me fzaem ficar atrelada a eventos políticos. Mas, parece que pro presidente e pros demais bois do gado, não é assim....

domingo, 24 de outubro de 2010

Atos e consequências

Preciso fazer mais desenhos.
Preciso ler mais sobre Urbanismo.
Preciso ter uma decisão mais firme das minhas escolhas. E arcar com elas.
Preciso me desprender mais do problemas do trampo público.
Preciso voltar a tocar gaita todo dia.
Preciso parar de me preocupar com o que os outros pensam de mim.
Preciso pensar mais em mim e nas minhas idéias.
Preciso ter a certeza de que não vou salvar o mundo.
Preciso acabar meu projeto de mestrado.
Preciso viajar mais.
Preciso me conhecer mais.

Senão vou achar que nunca vou dar conta de nada.
Senão essas tosses psicológicas vão detonar de vez meu pulmão.
Senão vou passar os fins de semana cada vez mais pensativa.
Senão não vou aproveitar a vida que tenho.
Senão vou esquecer quem eu sou de fato.

Eu não sei o quanto esses "preciso" podem me ajudar...mas só de enumerar tudo isso já vai me fazer ter um norte. Eu acho. Eu espero.

domingo, 17 de outubro de 2010

Para você, que não pretende votar na Dilma

[Eu trabalho num governo petista. Trabalho com obras numa das inúmeras favelas de Embu das Artes. Eu, junto com a Companhia Pública de lá, desenvolvemos projeto e construção de moradia para pessoas que tiveram de ser remanejadas de áreas de risco e áreas junto à córregos. Conversando com as famílias de lá, é impossível não ver as melhorias de vida.

Entrei nesse governo em 2009. Em 2010, já haviam melhorias significativas em cerca de 8 anos de governo do PT. Algo que não era conseguido pelos governos anteriores. Quem conhece Embu antes de 2001 (como eu e meus pais, ao ir na feira de antiguidades até antes dessa época), pode ver a diferença entre um governo participativo e outro de exclusão.

Não elogio diretamente o governo petista como um todo, mas sei bem os males de ter um governo psdbebista de volta. Antes um governo que dá direitos a quem merece que outro que privilegia as classes média e alta, sem atenção a quem precisa de verdade.

Enfim, só ver a mensagem abaixo [excelente, por sinal], para sanar todas as dúvidas em relação as dois candidatos em questão. Se gostarem, repassem por favor. Vale bem a pena e se vale, também, da mídia atual. Muito bem argumentado!

ps1.: só acho o título do texto equivocado. Mas, acho que tá valendo!
ps2.: nunca disse que meu blog não era político. Nunca disse que eu era uma pessoa apolítica]

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[direto do site http://aterceiramargemdosena.opsblog.org/2010/10/12/para-voce-que-nao-votou-na-dilma/ - publicado em 12 de outubro de 2010]

Você não votou na Dilma no primeiro turno. Também não pretende votar nela no segundo turno. Não apenas você não vai votar nela, como você tem alertado sobre os perigos de se votar na candidata petista. Você tem suas razões para achar que o voto em Dilma não é o melhor para o Brasil.

Eu não penso como você. Entendo que o melhor voto para o Brasil é o voto em Dilma Roussef, e não em José Serra.

A principal razão que, no meu ponto de vista, justifica o voto em Dilma não é uma única razão. Na verdade, são 53 milhões de razões: entre 2003 e 2008, foram 21 milhões de brasileiros que deixaram a miséria e outros 32 milhões que ascenderam à classe média. Os números dos que chegaram à classe média correspondem mais ou menos ao total de torcedores do Flamengo, e os que saíram da pobreza correspondem aproximadamente à torcida do Corinthians. É isso mesmo: o número de brasileiros que melhoraram de vida na Era Lula é um pouco menor que a soma das torcidas do Flamengo e do Corinthians.

A pobreza extrema no país foi reduzida à metade nos anos Lula. Esse salto não se deveu apenas ao bom momento econômico. Isso é fruto de medidas específicas do Governo Federal, tais como o Bolsa Família e o Bolsa Escola. Você chama esses programas de assistencialistas, de demagogia paternalista. Na sua concepção liberal de “Estado mínimo”, esses programas não têm justificativa. Mas os países socialmente mais justos foram aqueles em que o Estado assumiu um papel ativo na promoção do bem estar social. Você condena os programas brasileiros, mas, quando vem à Europa, você se embasbaca dizendo que a Suécia ou a Dinamarca é que são países “de verdade”, pois se importam com seus cidadãos. Os programas sociais brasileiros são irrisórios se comparados aos de países da Europa ocidental. Por que você etiqueta os programas assistencialistas suecos de “justos” e os brasileiros de “demagógicos”? O número de programas de suporte social de um país como a França é muito superior que o do Brasil. Para você ter uma idéia, aqui eu recebo uma ajuda de moradia, fornecida pelo governo francês a todo estudante que paga aluguel, seja ele francês ou não. Isso custa uma grana preta aos cofres franceses. Certa vez, comentei com um colega no trabalho que recebia essa ajuda.

Nunca vou me esquecer do que ele falou: “puxa, nem sabia que isso existia aqui na França. Sou classe média, não preciso desse auxílio, mas fico feliz de saber que os impostos que eu pago servem para ajudar estudantes como você”. Isso é civismo. É impensável ouvir isso da classe média brasileira, notória pelo seu acivismo. O que se ouve deles é que “a classe média é explorada”. Você deveria é ficar feliz de saber que parte de seus impostos são destinados a ajudar os brasileiros que podem menos.

Votar em Dilma é votar na continuidade desses programas. É a garantia de que mais compatriotas irão melhorar de vida. Ou você acha que vai manter esses programas um cara cujo vice propôs punir quem dá esmolas e que chamou o Pronasci de “bolsa-bandido”? Um cara cuja esposa chamou o Bolsa Família de “bolsa vagabundagem”? Você acha que esse senhor tem capacidade de diálogo com os mais desprovidos? Um cara que diz não entender os sotaques de goianos, mineiros e pernambucanos? Um cara que, como bem observou Idelber, inventou a favela de plástico? Um cara que diz para uma eleitora na favela “Não posso conversar agora. A senhora não poderia me mandar um fax?”? Esse senhor não demonstra ter canais de comunicação com os pobres. Serra diz que vai manter os programas sociais. Só que eu não confio no que Serra diz. Aliás, não confio sequer no compromisso que ele assume por escrito em cartório.

Foi sob o Governo Lula que a economia brasileira conheceu um período de crescimento expressivo, inclusive durante a crise mundial. Conheço seu argumento: “Lula continuou o que FHC fez”. Só que o próprio FHC reconheceu recentemente que a gestão econômica do PT tem méritos próprios. Insistir na tese de que tudo de bom da economia brasileira não tem sequer uma contribuição da equipe econômica de Lula, mas apenas de FHC e do Plano Real, tem tanto sentido quanto dizer que a pujança da indústria automobilística brasileira nos dias atuais é mérito de apenas um homem: JK.

Não foi apenas na gestão econômica que a gestão Lula foi primorosa. Há que se destacar a revitalização do sistema universitário público. Comparar a gestão Lula com Paulo Renato é como comparar o Barcelona ao Madureira. Foi nos anos FHC que o ensino superior privado conheceu fulgurante expansão – na maior parte das vezes, sem a contrapartida da qualidade – rifando vagas universitárias a megagrupos empresariais. Ao mesmo tempo, as universidades federais entraram em processo de sucateamento: Paulo Renato cortou verbas, restringiu concursos para professores e funcionários, priorizou a expansão do ensino privado, não promoveu uma política de assistência estudantil. Fiz o curso médico na UFMG durante os anos FHC. O descaso governamental provocava greves recorrentes (a de 1998 foi marcante) e provocou inclusive o fechamento do Hospital das Clínicas da UFMG, pelo simples motivo de que a verba federal não era repassada: centenas e centenas de alunos, além de milhares de pacientes carentes, sofreram com o fechamento do hospital. Hoje, o campus da UFMG tem outra cara: prédios novos e modernos foram inaugurados (Economia, Farmácia, Odontologia, Engenharia). A Cynthia Semíramis concorda comigo.

Lula investiu no ensino superior: criou 14 universidades federais e outras dezenas e dezenas de escolas técnicas, muitas delas em regiões menos desenvolvidas do país. Foi a política de Lula que permitiu a criação, por exemplo, do Instituto de Neurociências de Natal, que já está aí, repatriando pesquisadores e fazendo pesquisa em alto nível. Cargos docentes foram criados e a carreira universitária foi valorizada, em flagrante contraste com a ativa promoção da penúria que marcou a gestão Paulo Renato. Tudo isso propiciou que os mestres e doutores formados no Brasil ocupassem cargos na universidade brasileira, evitando o brain drain que por tantos anos sangrou a academia brasileira. O salto na pesquisa brasileira desde a eleição de Lula é bastante expressivo. Em 2003, os investimentos em ciência e tecnologia foram de 21,4 bilhões de reais; em 2008, já atingiam R$ 43,1 bilhões. Paralelamente, houve notável aumento da produtividade científica brasileira: as publicações em peer-review journals saltaram de 14.237 em 2003 para 30.415 em 2008. Subimos da 17ª posição no ranking da SCImago, em 2000, para a 14ª, em 2008. Passamos países com maior tradição de pesquisa, como a Suíça e a Rússia. A política de pesquisa do Governo Lula foi elogiada inclusive pela Nature, uma das revistas científicas mais importantes do mundo (aí, Tio Rei, coloque mais essa na lista do jornalismo chapa-branca). Eu não voto em José Serra porque não quero que a universidade e a pesquisa brasileiras sejam sucateadas novamente. Não merecemos outro Paulo Renato.

Você diz que o governo do PT é anti-democrático, que ele coíbe a liberdade de expressão e que ele ameaça a liberdade de imprensa. Você acha que o PSDB representa uma proposta democrática. Discordo nos dois pontos. Houve declarações atrapalhadas do governo no que diz respeito à imprensa, e não aprovo a atitude de Lula no episódio Larry Rother. Mas daí a dizer que governo do PT é anti-democrático e que cerceia a liberdade de imprensa vai uma distância muito grande. Nem mesmo o FHC sustenta que o Lula é stalinista – só aloprados como Olavão e o Tio Rei é que alimentam besteiras assim. Se, como você diz, o PT censura a imprensa a seu favor e coloca um monte de jornalista chapa-branca nas redações de todo o país, olha, então o PT tem que aprimorar seus métodos. Dê uma olhada nas últimas capas da revista semanal de maior circulação do país, ligue a TV no principal canal, ou visite um dos blogs políticos mais acessados e veja (ops!) se há algum indício de que o PT tolhe quem fala mal dele e quem aponta as lambanças do partido. Aí você diz que, no governo Lula, tentou-se criar o Conselho Nacional de Jornalismo e que isso era uma tentativa ditatorial de controlar a liberdade de imprensa. Se isso é ditadura, sua lista de governos anti-democráticos deve incluir também países em que o Conselho já existe, como a França e a Inglaterra, como bem lembra Jânio de Freitas. Você critica a TV Brasil, dizendo que o governo não tem que manter canal de TV. Diga isso a um francês. Ele vai lhe dizer que na França não existe um canal de TV nacional que seja público. Existem cinco.

Eu também li o editorial do Estadão, dizendo que Dilma é “O mal a evitar”, por representar uma ameaça à democracia e à liberdade de imprensa. Você achou bonita essa defesa do “Estado de Direito”, né? Por que o Estadão nunca fez um editorial como esse quando o Brasil efetivamente vivia sob uma ditadura, nos anos de chumbo? Por que, dias depois desse editorial, esse mesmo órgão que se põe como baluarte da democracia plural demitiu sumariamente uma colunista que apoiou o Bolsa Família?

E será que o PSDB é tão comprometido assim com a democracia constitucional e com a liberdade de expressão? E os arapongas da Abin na gestão FHC? De qual partido é Eduardo Azeredo, que propôs uma lei de controle da internet que é carinhosamente chamada de AI-5 digital? De qual partido é Yeda Crusius, que mobilizou a PM gaúcha para espionar uma deputada de oposição, inclusive suas crianças (via Idelber)? De qual partido é Beto Richa, que censurou sete pesquisas eleitorais, um blog e até um twitter? E o que dizer do Serra, que telefonou a Gilmar Mendes para que ele tomasse a decisão que o PSDB preferia, no que diz respeito aos documentos necessários à votação: isso é respeito às instituições democráticas?

Você reprova a política externa do Lula, dizendo que ele desonra a democracia brasileira, privilegiando o diálogo com regimes fechados e ditatoriais. Então me responda: onde estava sua indignação quando FHC condecorou o ditador peruano Alberto Fujimori com a Ordem do Cruzeiro do Sul?

Você vê com maus olhos as alianças políticas do governo Lula e acha que isso é um argumento forte para não votar no PT. Eu também não gosto do Sarney, do Collor, do Calheiros, do Temer, do Hélio Costa. Preferiria que eles estivessem longe do poder. Mas já passamos da idade de acreditar em purismo ideológico, né? Isso é coisa de adolescente que descobre a política. Fazer política é fazer alianças, muitas das quais difíceis de serem engulidas. Vai me dizer que você gostava de ver o sociólogo da Sorbonne de mãos dadas com o PFL de ACM e cia? Você gostava de ver o Renan Calheiros como Ministro da Justiça do FHC? Bem, talvez você nem sequer goste do Índio da Costa… Bem vindo à real politik, mon ami.

E sim, você vai me falar da corrupção na gestão petista. É verdade. No que diz respeito ao combate à corrupção o governo Lula não foi virtuoso – longe disso. Houve mesmo bastante corrupção. O mensalão existiu, não foi invenção. Mas, será que a oposição é impoluta e pode mesmo posar de moralmente superiora? Lembra-se do Mensalão Mineiro e do Azeredo? Do Ricardo Sérgio de Oliveira, caixa do alto tucanato, que levou R$ 15 milhões na privatização da Vale? Dos R$ 400.000 a cada deputado que votou a favor da reeleição? E o esquema de corrupção e espionagem, revelado no escândalo dos grampos durante a privatização da Telebrás, envolvendo FHC, o presidente do BNDES (André Lara Resende) e Luiz Carlos Mendonça de Barros (ministro das Comunicações de FHC)? E a farra do Proer? E o favorecimento ilícito da Raytheon na instalação do SIVAM ? E a endinheirada relação entre Chico Lopes (ex-presidente do BC) e o banqueiro Salvatore Cacciola? E Eduardo Jorge, assessor pessoal de FHC, envolvido em diversas negociatas, inclusive em “caixa dois” para a reeleição de FHC? Por favor, não me venha com essa conversa de que o PSDB não compactua com a corrupção.

Eu vou concordar com você que o Brasil precisa de investimento em infra-estrutura: portos, rodovias, aeroportos. Mas será que o governo que impôs à população brasileira o racionamento de energia é mesmo o mais preparado para conduzir esses avanços em infra-estrutura? Acho que não.

Mas talvez nenhuma dessas questões sobre economia, educação e gestão pública importem para você. Talvez o que mais lhe opõe à candidatura de Dilma Roussef sejam questões religiosas. Pode ser, por exemplo, que você se oponha à política petista em defesa dos direitos civis dos homossexuais. Você chama isso de “tentativa de implantação de uma ditadura gay no Brasil”. É engraçado ouvir que existe ditadura gay no Brasil das mulheres fruta, das dançarinas de axé, da erotização infantil, das peladonas do carnaval, das bancas em que pululam revistas masculinas de orientação heterossexual. Fique tranqüilo, essas coisas vão continuar acontecendo e ninguém está propondo instituir o monopólio da G Magazine entre as revistas de entretenimento adulto (fugiremos juntos do Brasil quando isso acontecer, ok?). Estamos falando em estender a uma pequena parcela da população os direitos civis desfrutados pela maioria. Nenhum governo do mundo tem poder para forçar alguém a assumir determinada sexualidade, porque os determinismos neurobiológicos da sexualidade passam ao largo da legislação dos homens – do contrário, eu acharia que os labradores machos lá do sítio da minha família só montam um no outro porque o governo PT apóia a causa homossexual (e eu desconfio que meus labradores não entendem muito bem o que seja o PL122). A questão aqui é apenas garantir que a expressão de determinado comportamento sexual não seja discriminada. Isso não é forçar a população a ser homossexual, nem calar heterossexuais. O prefeito de Paris é gay, assim como o de Berlim e a Primeira Ministra da Islândia. Eu, heterossexual, não sofro por morar em uma cidade governada por um gay.

Aproveitando o tema, permita-me uma pergunta: o que aconteceria se, ao invés de se mobilizarem maciçamente contra o “casamento gay”, os evangélicos se movessem por coisas que importam, como metrôs, ensino público, bons hospitais e punição a corruptos? Por essas e outras, é que indicadores como mortes violentas, saneamento básico e crianças nas escolas são bem melhores em Paris do que em São Gonçalo, cidade do Brasil com maior concentração de evangélicos. A luta contra a miséria e os embates por educação, transporte e hospitais de qualidade não parecem sensibilizar evangélicos – mas se dois marmajos querem juntar escovas de dentes no mesmo copo do banheiro, aí eles entram na briga, né? Essa miopia política acívica atrasa o país. O Brasil seria bem melhor para todos se os evangélicos batalhassem politicamente por coisas que realmente importam – e isso certamente não inclui ajustar o mundo aos estritos códigos comportamentais que defendem.

Há o aborto também. Você está certo: a Dilma é a favor do direito ao aborto (este vídeo é como batom na cueca, não tem o que discutir). Mas preste atenção: estamos tratando de uma eleição presidencial, não de um plebiscito sobre o aborto. E você sabe: o presidente não tem poder para assinar um papel e legalizar o aborto por conta própria, sem aprovação do Congresso, como se estivesse assinando uma ordem para comprar canetas Bic para escolas públicas. A discussão e a legislação sobre aborto são matéria do Congresso, não do presidente. Não misture as coisas. Não entre na onda dos que estão transformando essa eleição em um plebiscito.

O Brasil melhorou muito sob a égide de Lula. A imprensa mundial, dos veículos mais à esquerda (‘tá aqui o Figaro que não me deixa mentir) saúda os avanços na Era Lula. Você dirá, com razão, que toda unanimidade é burra. Sim, é verdade. Mas isso não significa que toda forma de discordância seja inteligente. Não é inteligente negar que, nos anos Lula, o Brasil se tornou um país socialmente mais justo e menos desigual. Isso é negar os fatos. E negar os fatos aos mais à direita nunca é inteligente.

Você pode até não votar na Dilma, por razões várias. Eu, de minha parte, prefiro apoiar quem tem feito do Brasil um lugar melhor para o maior número possível dos filhos deste solo: os brasileiros.