sábado, 23 de janeiro de 2010

Trampo e pequenas recompensas

Desde que comecei a trabalhar em Embu passei por inúmeras experiências, das mais gratificantes às mais tensas. Temos a filosofia de trabalho de sempre conversar com os moradores das áreas que fazemos os projetos - as favelas da cidade - antes de sair fazendo qualquer coisa. Muitas vezes é preciso fazer alianças que seriam condenáveis por muita gente de fora (e de dentro também). Mas só assim obtemos o respeito e a confiança de moradores que são retirados de áreas de risco, da beira de córregos transformados em esgoto, de áreas invadidas e ocupadas.

Essa semana, na quinta-feira, aconteceram algumas desgraças nas áreas de risco. Felizmente, ninguém morreu. Mas fomos acionados para dar soluções, para sermos cobrados. Nada mais natural. Com tanta terra caindo, tantas casas e barracos sendo interditados, com prédios vazios a tempo, esperando a burocracia do estado para que o pessoal os habitasse, o desespero estava no ar, e é compreensível que eles precisavam cobrar alguém. Sobrou pra gente.

Sendo assim, na sexta-feira trabalhamos muito, atrás de laudos da Defesa Civil, de mapas da área, do nome das pessoas mais afetadas. Muitos telefonemas, muita negociação, até sabermos que no sábado o estado iria nos atender, na capital. Isso era cinco horas da tarde, e era preciso avisar todo mundo que às sete da manhã do dia seguinte todos deveriam se encontrar e esperar um ônibus rumo à capital.

Sexta-feira, seis horas da tarde, com bar marcado em Embu mesmo, lá estávamos nós na área, avisando morador por morador sobre o compromisso do dia seguinte. Nove horas da noite acabamos de avisar, de explicar, de ver o choro do pessoal que ficou na segunda leva, de ver a alegria de quem ia receber um apartamento. Foi foda. De volta, fiquei no bar até às onze e meia da noite. Sabendo que no sábado, às sete e meia, deveria acordar para encontrar os moradores no centro de São Paulo.

Sábado, de ressaca e algumas cocas depois, encontrei minha chefe, na espera do ônibus de Embu, junto com o historiador que virou assistente social. Eu esperava algum tumulto, mas correu tudo tranquilo. As pessoas assinaram os contratos provisórios, ninguém fez confusão, explicamos várias vezes a burocracia, o cara do estado não deu previsão de entrega, e foi bem pressionado pelo pessoal - foi lindo! Uma parte dos moradores prometeu um churrasco em nossa homenagem.

Numa semana que, além de tudo isso, ainda tivemos problemas com um esgoto a céu aberto vindo dos prédios do CDHU, uma reunião um tanto tranquila com uma das comunidades mais tensas que prestamos serviço e com obra rodando, foi um sábado de redenção e de vitória. De mostrar que a gente não foge dos problemas, que vamos estar juntos até o fim. Que, apesar de não recebermos hora-extra e de não sermos obrigados a trabalhar aos sábados, vamos ser o apoio, e seremos cobrados até o fim.

E é nessas horas que eu fico orgulhosa de nosso trampo, mesmo que muitas vezes não sejamos reconhecidos, mesmo que não tenhamos dinheiro pra fazer mais e melhor. Nessas horas que eu me esqueço do dinheiro e tudo que me interessa é ajudar quem precisa. E é nessas horas que eu vejo que todo nosso esforço vale a pena.

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